(C) TCA: à sombra de uma azinheira
Nos dias de festa há sempre um renovar. Não só no natal ou no ano novo, com as esperanças de paz e de uma vida melhor, mas em todas. Lembrei-me disto ao terceiro cigarro. Afinal era uma promessa cumprida. Ou quase. Era de facto o terceiro dos três que tinha estipulado como limite diário no dia de ano novo. Apaguei-o a meio; ainda não era uma da manhã. Lembrei-me que tinha começado a fumar a 26 de Abril de 74 quando uma tipa grande e feia saiu de um camião de soldados. “Fuma um cigarro, puto. Do que nós precisamos agora é de homens.” A liberdade trouxe-me um vício.
Esqueçamos agora as manifs os cartazes e a pancadaria com os sociais-fascistas. Foram bons esses tempos. Pelos menos havia convicções. Coragem para falar mal dos padres e dos professores e de lhes chamar filhos da puta cara a cara. Era isso que mandavam os camaradas mais velhos e nós, livremente, obedecíamos.
Afinal sempre é possível recordar sem um cigarro na boca. Pudera... ainda está viva aquela primeira queca debaixo das escadas no Liceu. Quem seria a tipa? Bons tempos... Teso que nem um carapau mas feliz.
Olhando para o leitor de MP3 acabadinho de comprar quase solto uma gargalhada ao recordar o dia em que fomos roubar cassetes a mando de um camarada da Associação.
Passou. Passou muito tempo mas apetece-me sonhar de novo. Acreditar que ainda tenho direito à vida. Que nem todas as mulheres são iguais. Afinal ainda só conheci duas que não prestam mesmo. Talvez as outras não fossem assim tão más. Deve ter sido culpa minha; medos desnecessários, vícios do já longo celibato... É isso. Se há trinta anos desobedeci aos velhotes, corri, gritei, bati e levei... e, por insignificante e ilusório que pareça, até senti que ajudei, porque não voltar a acreditar? Amanhã telefono-lhe. Vou ouvir uma musiquinha e dormir. Não preciso de cigarros nem de whisky...
“La vie ne fait pas de cadeaux (...)” Ai este Brel e esta maldita tecnologia aleatória. Onde raio está o isqueiro?
luís n. - à luz da noite
10 comments:
Bom texto e belos "riscos" teus:) beijos
Gostei das cores e da textura... e das letras! :)
P.S. Andei a ver leitores de MP3; gostei de um "à prova de água" e com rádio. 8 horas de música com pilhas AAA. :) :) :)
Voltei! Fiquei com o este teu trabalho no olhar...
Que dimensões tem? Parece-me pequeno, não sei, mas imagino-o refeito numa tela grande... para aí uns 150 x 150 cms. :)
E que pena que a azinheira continua sem saber a idade, não é ?? Nem os tão modernos leitores de MP3 lhe valem.. :( Bj. Penelope
Vossa mercê não pára de me surpreender! Hoje é pelo texto que escreveu que aqui estou. (O risco é soberbo como sempre) "...apetece-me sonhar de novo. Acreditar que ainda tenho direito à vida. Que nem todas as mulheres são iguais..". Fico contente por o saber a renovar energias meu caro amigo. Que percebeu (finalmente?) que nem todas as tipas que há por ai são sacanas. E sobretudo, que a vida vale sempre a pena, mesmo com desaires pelo meio. Penso excatamente o mesmo, ainda que, pelo que me apercebo seja bem mais nova (mas com experiências tramadas já vividas). Você sempre me inspirou força com os riscos que produz, mas agora confirmo a sua pujança (que afinal tb o habita!) através do que escreveu hoje. Um grande abraço pa si. Desta sua admiradora. Azul.
acredito que as mulheres são diferentes! eu sou diferente acredito num simples olhar de um homem e de uma mulher sem sexo pelo meio...
acredito que as mulheres são diferentes! eu sou diferente acredito num simples olhar de um homem e de uma mulher sem sexo pelo meio...
acredito que as mulheres são diferentes! eu sou diferente acredito num simples olhar de um homem e de uma mulher sem sexo pelo meio...
Não te sabia pintor...!!! mas tb porque teria de o saber??? Talvez pelas palavras que tão bem sabes ordenar, numa tela feita de papel, ou de novas tecnologias. Tantas telas deves ter ainda para pintar e palavras para partilhar (rimou, mas sem intenção). Aliciante para a próxima visita. Fica bem,
O isqueiro bani-o quando deixei de fumar ... e às 3 foi de vez! Vai daí não posso valer ao luís :-))Belo texto que espelha uma vivência do 25 de Abril que me é, de algum modo, familiar. A tua pintura ... linda! Um beijo.
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