Monday, November 07, 2005

reflexos


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Aos cinquenta anos dei por mim a fumar ao espelho e a perguntar E agora, José. Fumar ao espelho, qualquer José sabe isso, é confrontarmo-nos com o nosso rosto mais quotidiano e mais pensado. Por trás, em fundo, tem-se um cenário do presente imediato (a porta do quarto, um cabide vazio) mas esse presente, logo à segunda fumaça já é passado (a porta desfez-se, o cabide voou) e tanto mais passado quanto mais mergulhamos no cigarro. O olhar envelheceu, foi o que foi.
E então, por mais que a gente diga que não, começam a aparecer as pegadas históricas do Dinossauro que nos andou a foder a vida durante cinquenta anos. Adivinhamo-las à super-superfície do vidro, são manchas fósseis, gretadas, então não se vê logo?, e, escuta à distância, ouve-se o carrossel do medo. Aqui e ali vão-se levantando farrapos do muito que em nós se adiou e do muito que em nós se morreu, e nalguns casos podemos até distinguir o traço de liberdade que abrimos com os nossos livros nessa desolação prolongada. Pronto, estamos feitos, José. De agora em diante começa o rememorar, devias saber.

fumar ao espelho; josé cardoso pires


(C) TCA Posted by Picasa

Thursday, November 03, 2005

cry me a river


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Caminhei sobre o mar
sonhei hoje
cruzei terras e céus
abraçando nuvens e desejos
crianças e poetas
esquecendo pecados meus
calei choros e soluços
converti-os
em sorrisos e gargalhadas
ah! se eu pudesse
flutuaria
dançando valsas
sem tropeçar nos teus pés

eu mais leve
o mundo também

"caminhada" na desfolhada

Tuesday, November 01, 2005

natureza humana


(C) TCA Posted by Picasa

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natureza mãe
deusa fértil
origem e matriz
no teu corpo rocha
protege-me do agreste
sopro da vida
mata-me a sede
de água sem mancha
embala-me o sono
limpo de angústia
encerra-me em ti.
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Quero-te, sem dúvida,
na incerteza de te querer.
Quero-te na orla afiada
da palavra que te envolve
e em arco me alcança.
Quero-te sem que a certeza
me atinja e me descanse.
Quero-te, sem dúvida.

"oração" e "será" - poemas de lique, mulher dos 50 aos 60

Saturday, October 29, 2005

from under the skin


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De que me falas eu não te ouço
Ontem sonhei que estava em nossa casa
Acordei sozinha no meio da rua

Não sei das portas as janelas não abrem
Gostava de sair daqui não sei andar

Perguntei ás pessoas como se respira
Ninguém sabe a resposta ninguém entende

Depois acordei outra vez e outra e outra
E não sei da casa e não te vejo

Onde estás onde estás onde estás

Estou acordada ou sonho ainda?

o pesadelo de monalisa no sítio da saudade

Wednesday, October 19, 2005

quase tocando


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Se o teu corpo tocasse o meu,
Agora...
Só um leve roçar,
Imperceptível...

teste imperceptível da cientista

comentários

os comentários deste blog passaram a ser do haloscan. nos posts anteriores os comentários do blogger podem ser lidos quando se abrir cada post individualmente.
peço desculpa pelo inconveniente.

Sunday, October 16, 2005

esquartejando


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pegar
num traço
de alma
espremê
-la e esquartejá
-la mostrá
-la num poema
e depois rasgá
-la

-la, de mjm, na baby lónia

Friday, October 07, 2005

nem todo o silêncio é d'ouro


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Acredito em

Meios-tons
Murmúrios
Subtilezas
Sensibilidade
Inteligência
Intuição

Mãos enluvadas
Transparências cerradas

Sépia e anil

Na magia
Do trigo dourado
Das sementes das árvores
Do cheiro das sombras
E do toque do siroco.

Mas sei que

Quando chega
A batalha final
Há branco e preto
Força e fraqueza
Coragem e cobardia
Voz de metal
Olhar firme e directo
Golpes rápidos e incisivos
Fé e medo
Luz e trevas

Desça em mim a força
Que só agora cheguei
A “meio da jornada”
E estou tão cansada...

convicção de hirondelle, uma andorinha voando no inverno

Tuesday, October 04, 2005

escapes


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Disseram-me uma vez:
“Um homem pode sempre fugir, seja lá do que for, mas nunca esconder-se”.
Ao que contrapus:
“Ou então pode sempre esconder-se, seja lá do que for, mas nunca fugir”.

pensamento do guerreiro no deserto alexandre dale

o sol preguntou à lua*


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há já muitas luas, um astro pediu-me um sol e uma lua bem coladinhos para oferecer à sua outra metade. a natureza recordou-me hoje esse risco em falta para comemorar esse fenómeno apaixonado que, contrariamente ao que alguns dizem, não me parece nada raro. hoje, e como não vi o fenómeno natural pq felizmente as constelações não o permitiram, aqui fica uma versão inventada de olhos fechados.
aproximem-se com frequência. afinal, eclipse é quando um homem quiser.

* o sol preguntou à lua (adriano correia de oliveira)

Friday, September 30, 2005

sad kiss


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Está aceite o beijo que me prometeste.
Tenho os lábios prontos.
Acabei de os pintar de vermelho.
beijo (a azul) daqui

Tuesday, September 20, 2005

introspecção


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É para mim que escrevo.
Foi a mim que perdi de vista.
escrito a azul aqui

Wednesday, September 14, 2005

abracinho

P: dás-me um abracinho?
R:

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blogging again... sorry
obrigado

Tuesday, August 16, 2005

brandos dias


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Deixo-te partir, amor!, e mais te não vejo!
Morra meu repetido pranto, ah! que pereça
Oh! não mais me deleite teu tão doce beijo
Céus!, qu' essa partida dor não me mereça!

É tão meiga paixão esta qu' inda te desejo
Cega estou eu, que teu olhar não escureça
De negro faço caminho, morte que almejo!
Parto eu depois de ti!, é pronta promessa!

Ó amargura!, palavra que é rima e é verso
Que seja ternura em teu lugar, pouco peço
Leva-me, irei, pois que assim me querias!

Ah!, dúvida que me toma os brandos dias!
Que me traz amante d' um sentido ingrato
Pois que ora por ti morro, ora por ti mato!

poema da senhora dos sonetos: MRML 08.07.2005

Tuesday, August 09, 2005

don't put your wires in my brain


(C) TCAPosted by Picasa
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If I were a swan, I'd be gone.
If I were a train, I'd be late.
And if I were a good man, I'd talk with you more often than I do.

If I were to sleep, I could dream.
If I were afraid, I could hide.
If I go insane, please don't put your wires in my brain.

If I were the moon, I'd be cool.
If I were a book, I would bend.
If I were a good man, I'd understand the spaces between friends.

If I were alone, I would cry.
And if I were with you, I'd be home and dry.
And if I go insane, will you still let me join in with the game?

If I were a swan, I'd be gone.
If I were a train, I'd be late again.
If I were a good man, I'd talk to you more often than I do.

If; Pink Floyd - Atom Heart Mother

Sunday, July 24, 2005

impressão digital

oi, fazes um desenho a meias comigo?

(C) TCA (C) príncepe lunáticoPosted by Picasa

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Os meus olhos são uns olhos,
e é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos,
onde outros, com outros olhos,
nao vêem escolhos nenhuns.

Quem diz escolhos, diz flores!
De tudo o mesmo se diz!
Onde uns vêem luto e dores,
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.

Pelas ruas e estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros gnomos e fadas
num halo resplandecente!!

Inutil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos!
Onde Sancho vê moinhos,
D.Quixote vê gigantes.

Vê moinhos? São moinhos!
Vê gigantes? São gigantes!

António Gedeão

Friday, July 22, 2005

aprendiz de feiticeiro


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Uma gota… e mais outra,
Uma hora.
Um fumo, um vapor
Outra hora
O fluido que foi verde e derramou
A espera!
à minha passividade sucede-se a impaciência
A saturação... a frustração!
Que me querem?
Para que me chamam?
Eu não estou, não posso ir... não quero ir
Vou esperar... aqui, no escuro!
Virá um dia em que os meus
fumos e fluidos serão os mais coloridos
E as suas cores não caberão aqui
Libertar-se-ão dos meus limites
Porque eu obtive o composto da
FELICIDADE

C.C. (dedicatória a um aprendiz de químico)

Tuesday, July 19, 2005

fachadas perversas


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Dizem as repórteres mais seniores da Voz da Beatice, diário mais que oficial da paróquia, que o belo homem, o senhor padre Alberto Rosa, só tem olhos para a igreja e para as flores do seu jardim. E, de facto, assim é. Na sua sacra rotina, depois da santa missa, tagarela com a comunicação social e volta para o seu recanto. Nessa manhã entrou misteriosa a Filomena, a sua mais encantadora catequista, interrompendo a leitura em que se deleitava.
- Que te traz, minha filha?
- Ai. Estou tão contente... mas acho que o senhor não vai gostar.
- Diz minha filha... A mão foi acarinhando o joelho, subindo pela perna que ora procurava ora se afastava da outra.
- Ai padre... Se não pára... Já estou a ferver.
- Conta lá fofinha que ideias trazes? de que é que achas que hoje não vou gostar?
- Não é bem isso, disse ela fechando os joelhos.
- É que, sabe..., mas não se preocupe que não digo nada, até estou contente com isso... e não me importo! a sério que não importo mesmo. O meu namorado até...
- Vá. Pára lá com isso e diz de uma v...
- Estou grávida! É seu.
O pobre servo fitou o seu amo que já o mirava complacente lá do crucifixo da parede.
- Não se preocupe; Não me importo, padre; eu convenço o meu namorado que é dele.
- Pois é... Mas isto nos dias de hoje já não é assim. Eu sei... se sei, minha filha! Agora está tudo bem mas depois se a coisa muda.... Não, espera. Espera! Tenho um amigo no Porto que conhece...
- Nem pense, padre. Não vou fazer isso. Além do dinheiro, que não tenho, isso é ilegal e muito arriscado.
- Espera, espera minha filha, tem calma. Eu pago tudo. Paga nada – sabe que um aborto fica muito caro. E nunca o faria em Portugal. Alem disso quero o bebé.
- Tem calma minha filha... Tem calma. Quanto queres?
- 3000 euros, padre.
- Oh filha... por amor de deus, a igreja não tem esse dinheiro.
- Não se preocupe. Fique descansado eu não faço. Não se preocupe, a sério.
- Está bem, disse o padre bonacheirão caindo na sua velha poltrona. Passa cá amanhã.
Recebeu um beijo na careca lustrosa e ficou matutando enquanto ela saía jovial ondulando a saia colorida: 600 contos um aborto. Raio de fedelha, mas é sobrinha do Dr. Gildo... Está o mundo perdido, meu deus. O último custou-me pouco mais de 100.

Friday, July 15, 2005

sabedoria


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Durante o processo de criação, o artista e a obra influenciam-se mutuamente: a obra oferece-lhe constantes sugestões, que visam suplantar o projecto inicial do criador. Se este possuir a humildade e a autocrítica suficientes para atender a tais alvitres e seguir-lhes os ensinamentos, criará uma obra que transcenderá as suas capacidades pessoais.

Karl R. Popper in "O conhecimento e o problema corpo-mente"
tirado daqui

Wednesday, July 13, 2005

tarde


(C) príncepe lunático Posted by Picasa

era tarde tão tarde e escuro que a noite tardava
era noite tão fria e tão tarde que o corpo tremia
era ânsia o tremor que o amor e o desejo calava
era tarde na vida e na noite e na estrada cheia e vazia

e quando à noite surgiste e brilhaste não foi tarde nem cedo nem noite nem dia...
meu amor meu amor foste corpo e desejo rasgado na alma que já tarde amanhecia
foste o mar de ternura que na noite sem sono e sem frio foi tumulto e brandura
meu amor meu amor minha vaga perdida surgiste na noite e brilhaste na vida

Tuesday, July 12, 2005

estrela

quando à noite surgiste e brilhaste não foi tarde nem cedo nem noite nem dia...

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Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia
Eu esperava por ti tu não vinhas, tardavas e eu entardecia
Era tarde, tão tarde que a boca tardando e o beijo mordia
Quando à boca da noite surgiste na tarde tal rosa tardia

Quando nós nos olhámos tardámos no beijo que a boca pedia
E na tarde ficámos unidos ardendo na luz que morria
Em nós dois nessa tarde em que tanto tardaste o sol amanhecia
Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Foi a noite mais bela de todas as noites que me adormeceram
Dos nocturnos silêncios que à noite de aromas e beijos se encheram
Foi a noite em que os nossos dois corpos cansados não adormeceram
E da estrada mais linda da noite uma festa de fogo fizeram

Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram
Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam
Era a noite mais clara daqueles que á noite amando se deram
Entre os braços da noite de tanto se amarem vivendo morreram

Meu amor, meu amor
Minha estrela da tarde
Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza
Se tu és a alegria ou se és a tristeza
Meu amor, meu amor
Eu não tenho a certeza

Eu não sei meu amor se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto
É por ti que adormeço e acordo e acordado recordo no canto
Essa tarde em que tarde surgiste de um triste e profundo recanto
Essa noite em que cedo nasceste despida de mágoa e de espanto

Meu amor nunca é tarde nem cedo
Para quem se quer tanto...

Estrela da tarde, Ary dos Santos

Friday, July 08, 2005

corpo


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um beijo de cada cor; uma cor de cada vez; percurso quente de amor a pintar a tua nudez.

Saturday, July 02, 2005

A um deus perverso


(C) TCA Posted by Picasa

Porque és infinitamente bom
Fizeste-nos à tua imagem e semelhança
E cá vamos, filhos e súbditos da herança.
Olha cá para baixo e vê os filhos que criaste
Alguns, se são teus filhos, por certo saem à mãe
Mas ela é boa e santa. És tu.
Outros são enjeitados, pai desnaturado.
São filhos de deus ou filhos da puta?